Indy 500 IndyCar

Vencer as 500 Milhas é algo épico. E o drama também

23/05/2018

Vencer as 500 Milhas é algo épico. E o drama também

Ao longo dos mais de 100 anos de disputa no oval de Indianápolis, a Fórmula Indy já proporcionou capítulos de glória, fama e conquistas um tanto surpreendentes no verdadeiro templo sagrado do automobilismo mundial. E no caminho inverso dos grandes momentos que entraram para a história, também foram registrados acidentes terríveis, alguns deles até fatais além de muito drama nas disputas dentro do traçado. Aconteceram diversos episódios inclusive em que grandes pilotos acabaram não obtendo o tempo necessário para se classificar e assim não alinharam no grid do épico evento.

Mais um capítulo inesperado foi protagonizado no último sábado durante o famoso bump day para a prova a ser disputada no próximo domingo. O canadense James Hinchcliffe é piloto da equipe Schmidt Peterson e dono de cinco vitórias na categoria, mas não conseguiu o tempo de volta e a velocidade que eram precisos para se classificar. Ficou de fora e só com um verdadeiro milagre ele ainda pode conseguir outro carro e disputar a mítica corrida. Especula-se que ele poderia sentar no cockpit de um carro a ser comprado a partir de outro time ou assumir a vaga de algum companheiro que conseguiu entrar para a famosa etapa. Por enquanto nada se confirmou. A piloto Pippa Mann passou pelo mesmo problema a bordo de um carro pouco competitivo e também terá que acompanhar a etapa como espectadora.

Apesar de ser um aspecto até injusto e duro com os competidores que esperam um ano para participar de um dos maiores eventos esportivos em escala global, o regulamento está lá há muito tempo e estipula o mesmo para todos. Quem não se classificar entre os 33 nomes está automaticamente fora. Regras do jogo e que os envolvidos sabem muito bem ao buscarem uma vaga. É a emoção do esporte sendo colocada em questão e antes mesmo da grande cereja do bolo, ou seja, as 200 voltas de prova em um dia que reúne fãs de todo o mundo na capital mundial da velocidade.

Se para a britânica Pippa Mann (ao volante de um modesto carro da Dale Coyne) ficar de fora não foi exatamente algo absurdo, já para Hinchcliffe foi realmente mais surpreendente. O bólido do time Schmidt/Peterson vem se mostrando competitivo há várias temporadas no certame da Indycar. E foi muito mais do que isso, afinal pode-se constatar a competitividade e regularidade através dos tempos obtidos nos treinamentos durante a semana anterior. O canadense vinha mostrando ritmo e consistência para se colocar entre os ponteiros no pelotão. Bastou chegar o bump day e o carro do carismático e talentoso esportista não estava no melhor dos dias. Com terríveis vibrações nos pneus ficou praticamente impossível obter uma boa média de velocidade nas quatro voltas a serem percorridas no momento de classificação.

Em edições recentes das 500 milhas de Indianápolis a crise econômica mundial e que não poderia deixar de ser diferente afetou também o cenário americano proporcionou disputas de classificação com apenas o número mínimo e tradicional da pista, os 33 carros. Assim, praticamente havia sido eliminada a importância do bump day, dia em que os mais lentos são “cortados” da grande corrida entre todos que vão para a pista buscar o resultado. Vale lembrar que durante os anos 1980 a Indy 500 chegou a ter mais de cem competidores lutando por um espaço no grid, outros tempos! Por isso mesmo o fato de se classificar em si já é uma grande vitória. E na tristeza de Hinchcliffe e dos profissionais na equipe podemos lembrar de histórias marcantes e muito difundidas entre os especialistas e fãs da categoria.

Talvez o momento mais chocante em uma classificação de Indianápolis tenha acontecido em 1995, o último ano antes da cisão na Indy que gerou categorias rivais como a própria IRL e a CART. Os carros da Penske, até então com desempenho superior e absoluto devido a uma especificação de motor vencedora proporcionada pela Mercedes no ano anterior estavam de volta ao regulamento comum e perderam essa vantagem. O rendimento dos propulsores até então mascarava as deficiências técnicas do carro. Os chassis próprios do time e sob o comando de Al Unser Jr. e Emerson Fittipaldi não conseguiram, então, demonstrar em momento algum os sinais de bom rendimento. Vale lembrar que ambos os competidores eram os dois últimos vitoriosos no grande evento. Nem mesmo a ideia de alugar carros de equipes rivais ajudou o time tão tradicional e acostumado com as vitórias naquela altura. No final das contas acabaram realmente fora do grid e tiveram que se conformar com o péssimo resultado além, é claro, da publicidade negativa.

O veterano e tricampeão Bobby Rahal passou pelo mesmo problema na edição de 1993 e quase repetiu a dose no ano seguinte quando só conseguiu entrar na lista da corrida após também trocar de chassis e até de motor. Em 2013 o mexicano Michel Jourdain Jr. passou pelo mesmo problema pilotando o carro da Rahal. E pelo lado positivo, tivemos classificações emocionantes pelo lado dos brasileiros. Podemos relembrar inclusive duas ilustres e memoráveis: em 2006 o então novato Thiago Medeiros fez um verdadeiro milagre a bordo da equipe PDM Racing. Após bater nos treinos, o time precisou remendar o bólido para devolver o piloto na pista e assim ele pudesse tentar a classificação.

Em uma verdadeira bacia das almas e um carro que parecia uma colcha de retalhos, tudo deu certo e ele conseguiu fazer parte da lendária disputa. E não poderíamos deixar de fora Roberto Moreno. Em 2007 o eterno SuperSub mais uma vez atendeu ao chamado de uma equipe. Naquela ocasião foi a Chastain Motorsports, que precisava de um substituto para o lesionado Stephan Gregoire. “Pupo” usou de todo o seu imenso talento e colocou o carro no grid, assim como havia feito na Fórmula 1 ao classificar a Andrea Moda na difícil pista de Mônaco. O choro e a comemoração nos boxes ficaram seguramente registrados nos livros de história em Indy.

 

Voltando a falar de Hinchcliffe, vale lembrar como a vida e o automobilismo fazem o ser humano passar por altos e baixos ao longo de uma trajetória. Em 2015 o canadense quase morreu após uma pancada na saída da curva 3 durante os testes. Uma suspensão perfurou o cockpit e entrou no corpo do piloto da Schmidt Peterson. Apesar de correr risco de morte, ele perdeu o resto da temporada, mas se recuperou muito bem. Tão bem a ponto de ser o pole do ano seguinte, em 2016, a edição dos 100 anos da corrida.

E neste ano de 2018 outra decepção aconteceu, e apesar das lamentações e frustrações que o fato pode gerar, com certeza isso pode fazer com que o esportista e o time aprendam bastante e fiquem ainda mais fortes para o futuro. Portanto, falar de Indianapolis é falar da emoção pura e máxima do automobilismo. A mais completa imprevisibilidade em uma única corrida. Ela ainda preserva sua essência e move multidões a cada ano em direção ao oval mais famoso do mundo.

Por James Azevedo (@JamesAzevedo), 30 anos, jornalista, apaixonado por esportes a motor desde criança. Formou-se pela FACHA (Faculdades Integradas Hélio Alonso). Entre trabalhos e colaborações: site Jogada Ensaiada, Portal da Band e Rádio Bradesco Esportes FM. Colaborador do Pop Bola Esporte Clube.

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Jornalista. Abril, UOL, Yahoo, Estadão, Correio Paulistano.
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