Automobilismo F1

Outra mudança na pontuação da #F1? Não se agrada a todos, mesmo.

20/07/2018

Outra mudança na pontuação da #F1? Não se agrada a todos, mesmo.

Eu comecei a acompanhar a F-1 com algum afinco mesmo lá pelos idos de 1985, cuja temporada, junto com a de 1986 e 1987, foi uma das mais disputadas da história da categoria. Dá para contar nos dedos quantos campeonatos tiveram tantos vencedores diferentes e quantos postulantes ao título haviam nas últimas etapas. Há exatos 32 anos, a pontuação era concedida aos 6 primeiros de cada corrida, o campeonato tinha 16 etapas e os pilotos podiam descartar os cinco piores resultados da temporada, desde que dentro do limite de 90% de voltas completadas, para contar na classificação final.

Imagine o Oswald de Souza fazendo contas de chance de título no ábaco antes do GP do Japão. Coisa de maluco. Este sistema favoreceu a recuperação de Senna em 1988, por exemplo. Naquela temporada, o brasileiro fez menos pontos no total que Prost. Porém, um quarto e um sexto lugares em Portugal e Espanha o colocou em condição de conquista do título no Japão com uma vitória. Ali, Senna deixava de descartar dois pódios.

Em 1991 o sistema passou a 10-6-4-3-2-1, sem descartes. Perdurou até o domínio da Ferrari no início dos anos 2000, quando passou a ser 10-8-6-5-4-3-2-1 para tentar fazer com que a distância de Schumacher para os rivais fosse menor que 100 pontos ao final da temporada. Em 2010, tivemos a introdução do sistema que persiste até hoje, dando pontos aos dez primeiros.

“Di Novo!”

Eis que a F1, agora, cogita pontuar todos os pilotos participantes da corrida, já que planeja liberar a adoção pelas equipes entre 1 e 3 carros. Algo parecido que aconteceu até o próprio 1985, com a Renault inscrevendo três carros em algumas etapas. Seria algo similar ao que faz a IndyCar nas etapas. Entretanto, na categoria americana basta ao piloto completar uma volta competitiva na prova e estacionar o carro e, voilà: pontos na tabela para o digníssimo. Espero que a F1, caso adote essa aberração, pelo menos considere o complemento de 93% da distância da corrida.

Alonso foi um dos primeiros a criticar a proposta. Para ele, se deixaria de reconhecer os pequenos milagres das corridas – quando um piloto de uma equipe ínfima conquista um ponto. Para ficar num caso recente que não denuncie minha idade, Jules Bianchi em Mônaco e fica aqui também nossa homenagem. Agora, denunciando minha idade, temos pontos feitos por Rial, Osella, Zakspeed e Onix, os quais foram conquistados à custa de abandonos ou acidentes das equipes de ponta nessas corridas, em verdadeiros milagres operados por Ghinzani, Johansson e Tarquini, por exemplo. Imagine, numa F1 que tinha pré-classificação, uma equipe com 10% do orçamento da outrora grande McLaren ou Williams pontuando. Era um título mundial conquistado. Sem exageros.

Discordâncias

Eu concordo que os pontos devem ser distribuídos mais restritamente na categoria, uma vez que o critério de desempate de quem está zerado sempre foi, e sempre será, a melhor quantidade de, por exemplo hoje, 11º lugares que determinado piloto conseguir. O ponto que Alonso toca, no qual discordo dele, é que ninguém lembraria do nono lugar de Bianchi caso não houvessem pontos concedidos. Um exemplo disso é a quantidade de sétimos lugares que Pedro Paulo Diniz conquistou na categoria, sem ponto algum. Ninguém lembra. Ainda podem colocar nessa conta boas corridas de Burti, Pizzonia e Zonta que não foram pontuadas, mesmo chegando entre os dez primeiros.

Meu contraponto ao espanhol é que esses desempenhos são apreciados por quem acompanha a categoria. Ainda que a carreira do piloto não seja aquele primor, nós reconhecemos quando este faz boa prova. Ou vocês acham que Michele Alboreto levando uma Minardi, em 1994, ao sétimo lugar não seria algo milagroso? As corridas continuariam a ser as mesmas. A mudança, neste caso, seria de percepção dos fãs de qual piloto seria melhor, caso olhassem apenas a tabela. Com mais de cinco pilotos zerados, fica difícil comparar, precisam puxar sempre à memória um desempenho ou outro para argumentar. Nesta temporada, Grosjean ficou zerado até o GP da Áustria. Alguém tem alguma dúvida de que o francês é melhor piloto do que Sirotkin, zerado até o momento? Ou Ericsson, que pontuou antes dele na temporada?

Os pequenos milagres na categoria continuarão a acontecer. Seja um pódio de Stroll ou um sexto lugar de Leclerc, esses desempenhos são comparáveis ao que as equipes pequenas faziam no início da década de 90, ou o que acontecia quando os aventureiros dos anos 50 faziam sobre seus carros de quase fabricação própria. A F1, por meio das ações do Liberty Media, tem tomado algumas decisões que são muito questionáveis no ponto de vista técnico ou desportivo. E é aí, pelo menos para este que vos escreve, que estão os problemas da temporada atual.

Zonas de DRS a esmo nas pistas, um regulamento aerodinâmico que impede que um caminhão ande atrás de um carro da categoria e o excessivo número de etapas faz o tal “valor de mercado” da categoria cair. Estamos sempre dependendo da entrada de um “safety-car” ou carro das três equipes grandes vindo de trás em recuperação para que as corridas passem a ser interessantes no seu decorrer. Para quem tem como primeira memória da categoria do GP da França de 1985, isso é demasiadamente frustrante. Recomendo buscarem essa corrida na rede para que entendam ao que me refiro.

Entretanto, a própria Liberty Media consegue se atrapalhar no andor, tendo como exemplo a saída da mesa de negociações das montadoras sobre o regulamento técnico de motores de 2021. Os americanos, que são muito competentes quando olhamos a forma como promovem o show – ainda que eu veja com certa reserva aquela estrela virtual da Heineken durante as transmissões – são incapazes de controlar os egos dos chefes de equipe e representantes de montadoras. Algo que Bernie Ecclestone fazia com maestria. Ele, muito mais do que qualquer um hoje, sabia que não era possível agradar todos ao mesmo tempo, daí sua conhecida mão de ferro.

Vai aqui no final aquele pedido aos comandantes da categoria: adotem um, dois ou três carros por equipe, será ótimo; deixem pontuar no máximo dois por equipe e distribuam pontos até os 8 primeiros. A F1, comportando-se assim desde 1950, é o topo do automobilismo. Liberar pontuação para qualquer piloto que se coloque entre os 20 primeiros que chegam ao final da corrida só faz mal a essa fama.

Por Carlo Zanovello (@NoVacuo)

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Jornalista. Abril, UOL, Yahoo, Estadão, Correio Paulistano.
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