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O problema é dinheiro?

09/08/2018

O problema é dinheiro?

Em razão da localização atual deste que vos escreve, acompanhar as provas da Stock Car no Brasil tem sido uma tarefa um tanto difícil, até porque a categoria tem um canal de vídeo oficial que não libera imagens da corrida para outros continentes. Vai ter medo de VPN assim lá no escritório central. Entretanto, os relatos de adiamento de treinos em Goiânia para a Corrida do Milhão e os comentários sobre algumas decisões da direção de prova durante a corrida trouxe ao pensamento uma pequena tese a respeito do automobilismo no Brasil: será que o problema é a falta de dinheiro?

Lembro do início dos anos 2000 quando a administração de Interlagos era relutante em receber etapas da então Fórmula Truck no traçado. Cheguei, inclusive, a escrever no antigo Amigos da Velocidade sobre o quanto não se ganhava dinheiro, ambas categoria e administração, com a não realização de uma corrida por lá. Feita a primeira, a maior categoria de caminhões do Brasil tornou-se Copa Truck e, mesmo durante a imbecil “greve” dos caminhoneiros, houve corrida com bom público lá. Bastou apenas um teste de resistência do asfalto versus peso gerado por um dos bólidos na pista e chegou-se à conclusão que um caminhão gerava menos dano à pista que um Fórmula 3. Tudo baseado em um relatório técnico detalhado. Em “engenheirês”, isso quer dizer boa vontade, numa tradução livre.

Voltando à Stock Car, foi feito um relatório técnico liberando a pista para a disputa no anel externo da pista goiana. Confesso ter algumas restrições a provas em anéis externos, já que os traçados brasileiros são muito ricos em seletividade e pontos de ultrapassagem, salvo raras exceções. Isso à parte, eis que os treinos são atrasados devido à falta de segurança em uma das curvas do circuito. Se estava inseguro, porque a liberação anterior? Quem responde por isso? Será que não era o caso de colocar um carro do Brasileiro de Marcas na pista, pelo menos, para avaliar a velocidade de aproximação na curva? Enfim, fora isso, a demora em liberação de pista após entrada de safety car e a forma como os pneus são arremessados à pista em acidentes dão alguma corda à minha tese. Já passou da hora de amarrarem um cabo de aço em cada uma das rodas para evitar esse tipo de incidente. Parece que estamos sempre à rabeira das melhores práticas.

Não que seja necessária uma formação acadêmica específica para gerir uma categoria. Basta ser uma pessoa com conhecimentos de gestão estratégica e um bom envolvimento com outras pessoas, competentes em cada uma de suas áreas de atuação – financeira, técnica, desportiva, divulgação – e, claramente com algum investimento, temos algo que seja vendável à televisão e, principalmente, aos fãs. Deixo claro que não duvido aqui da capacidade técnica de quem está no comando do automobilismo no Brasil. Longe disso, já que muitos têm de experiência no automobilismo o que eu tenho de idade. Mas, se um fã de automobilismo daqui do Velho Continente entrar hoje em sites especializados de automobilismo no Brasil, encontrará resultados de provas, lindas fotos, extensas reportagens e críticas à gestão.

Lógico que isso não é de hoje, tendo em vista no passado os incidentes na prova de Ribeirão Preto da própria Stock Car. O que aponto aqui é a falta de mudança a médio prazo. No começo do ano apareceu um vídeo em uma de minhas redes sociais de um acidente numa das etapas do Paulista em Interlagos, no S do Senna. Um carro havia rodado, havia bandeira amarela sinalizando bem em frente ao acidente – e não antes. Resultado: um dos pilotos que vinha atrás em briga de posição veio mais aberto, não viu a rodada e encheu o carro rodado. Sorte que não houve nada de, muito, pior. Bastava a sinalização em um posto anterior e as chances desse acidente acontecer seriam menores.

Os clubes de automobilismo, salvo eventos de grande monta, não investem em formação de comissários de pista ou diretores de prova. São, na maioria das vezes, pessoas com algum envolvimento com o automobilismo local e amor ao esporte que dedicam parte do tempo livre, num modelo de voluntariado ou pequena remuneração, que acabam fazendo parte do corpo técnico e desportivo das etapas. Eu não vou sonhar com uma profissionalização da atividade, ainda sabendo que a quantidade de eventos de automobilismo no Brasil caiu vertiginosamente durante essa baixa econômica que o País vive. Entretanto, essa falta de vivência de pista faz com que, em momentos de tensão, decisões sejam tomadas mais num estilo apagar de incêndio do que prevenção. Notem que não estamos aqui a pedir largadas atrás de safety car na chuva em garoas finas, como a FIA utilizou várias vezes nos últimos anos em diversas categorias. Mas, os erros de avaliação e inspeção deixam claro que algo precisa ser feito logo.

O automobilismo brasileiro tem várias cabeças pensantes que poderiam contribuir nessa virada técnica. Obviamente, a relação desgastada entre alguns deles após todos esses anos gera muita política que deve ser contornada. Um pouco de calma e uma mesa com café quente deveria ser suficiente para juntar todos os donos dessas boas ideias para um papo aberto, com propostas reais para a melhoria do show. Hoje, além de não termos formação de jovens talentos como ocorreu nas décadas de 80 e 90, nas quais sobravam crises financeiras, não temos um show seguro para os pilotos e algumas cenas que fazem os fãs de automobilismo colocarem alguns asteriscos em uma das maiores categorias nacionais. Querem algum ponto de pesquisa? O vôo para Buenos Aires e o deslocamento para qualquer circuito da Argentina não é tão caro assim.

Antes de terminar a coluna de hoje, quero pedir desculpas ao Rogério Elias e à trupe do Amigos da Velocidade. Receber uma nova vida dentro de casa foi um pouco mais conturbado do que o esperado e isso roubou um tempo maior do que eu esperava. Essa semana, enfim, terminou super bem com o Arturo dentro de casa mais vivo do que nunca. Em sete dias de recém nascido, sinto que ele ensinou muito mais a mim do que eu a ele. Somos aqui em casa um só coração cheio de amor e carinho. Que a vida de cada um de vocês que esteja lendo essa coluna seja assim para o resto da vida, mesmo com todos os obstáculos que ela nos dá.

Por Carlo Zanovello (@NoVacuo) & Arturo Quirino Zanovello

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Jornalista. Abril, UOL, Yahoo, Estadão, Correio Paulistano.
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