Automobilismo Fórmula E Velocidade

Um automobilismo seguro, confiável e “limpo” por Lucas di Grassi

24/07/2018

Um automobilismo seguro, confiável e “limpo” por Lucas di Grassi

Por estar envolvido com um campeonato inovador como é a Fórmula E, e também por ser atualmente o CEO do primeiro campeonato que utilizará inteligência artificial no mundo, a Roborace, muita gente me pergunta sobre o futuro do automobilismo. Eu não tenho bola de cristal, mas algumas coisas acabam sugerindo cenários possíveis. A evidência mais óbvia é que o automobilismo atual chegou a uma encruzilhada. Os motores a combustão, por mais desenvolvidos que sejam, não representam mais o conceito de modernidade que os cidadãos atuais procuram. Poluir está fora da moda – felizmente – e as pessoas estão ansiosas para que os engenheiros definam logo o que deve ser considerado a tecnologia segura e confiável do futuro no esporte – que também será aplicada nos nossos carros de rua.

Da mesma forma que a indústria do automóvel está tendo que se reinventar, todo esporte que utiliza carros terá que rever seu papel – uma espécie de reposicionamento de mercado. A Fórmula E, por exemplo, fez isso de maneira muito clara e objetiva, passando uma mensagem mais ou menos assim: sou uma categoria de carros do tipo Fórmula, com motores alimentados por um tipo de energia viável para o futuro do automóvel, a elétrica, e quero ajudar as fábricas a permanecer no esporte e os fãs a se aproximar dele.

Um dos resultados disso é o fato de a Fórmula E ter no ano que vem o investimento de mais fabricantes de veículos do que a Fórmula 1, Fórmula Indy e Nascar… somadas. Esse é um fato inédito e mostra que a categoria dos carros de corrida elétricos acertou no seu posicionamento. As demais também terão que definir melhor seu papel.

A Fórmula E não precisa necessariamente ser a mais rápida ou a mais tecnológica – esse papel, que é até problemático pelos custos que envolve, pode continuar com a F1. Sem problemas. O importante é que o fã – que aqui está na posição de um consumidor – deve encontrar na “prateleira” do automobilismo produtos bem definidos, que digam o que querem ser e o que oferecem.

Isso ajuda as pessoas a entenderem melhor e apoiarem cada categoria de forma distinta. Até mesmo por que a globalização gerou há alguns anos um processo mundial de polarização que as tecnologias digitais só vieram a aprofundar. Antigamente, para acompanhar uma categoria que não compete no seu país, você tinha muita dificuldade. Hoje, basta alguns cliques no celular para saber tudo o que está acontecendo. E assim as pessoas passaram a comparar e a optar pelas suas categorias preferidas – mais ou menos como acontece no futebol, no qual times como Barcelona e PSG são seguidos por pessoas de todo o mundo.

No caso do nosso esporte, esse processo passa agora a sofrer também a pressão da necessidade de tecnologias mais “limpas” – como a dos motores elétricos – e mais avançadas, como a inteligência artificial, a grande estrela da Roborace. Mas sempre alinhadas com o que a indústria e os consumidores querem ver em seus carros de rua. As categorias principais do automobilismo são, agora, e cada vez mais, um laboratório de desenvolvimento. Essa seria uma de suas principais missões, no meu ponto de vista.

O exemplo da Fórmula E está sendo seguido e observado de perto por gestores do esporte em todo o mundo. Aqui mesmo no Brasil, a Stock Car adotou o nosso fan boost, uma forma de envolver mais o fã com o resultado das corridas. Este modelo também está quebrando algumas barreiras até então intransponíveis. É o caso da Suíça, que baniu o automobilismo há seis décadas devido ao um gravíssimo acidente em Le Mans. O governo local mudou a legislação para permitir corridas de Fórmula E nas ruas de Zurique.

Outro exemplo é Nova Iorque, uma cidade cuja gestão é acompanhada por diversas metrópoles mundiais. Os nova-iorquinos também abraçaram a Fórmula E depois de negarem repetidos pedidos da F1 e da Nascar para competir em suas famosas avenidas.

Neste ano, eu ganhei corridas nestas duas cidades. Como esportista, me sinto honrado. Como cidadão, fico feliz por ter sido parte de um capítulo importante da história.

Abraços a todos e obrigado pelo apoio que têm me dado todos estes anos.

Por Lucas di Grassi (@LucasDiGrassi)

COMPARTILHE:

Jornalista. Abril, UOL, Yahoo, Estadão, Correio Paulistano.
Comentários