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Games: Draft #F1… Uma festa estranha com gente esquisita (?)

12/07/2018

Games: Draft #F1… Uma festa estranha com gente esquisita (?)

Nesta última segunda-feira, pós-ressaca do GP da Inglaterra, nós, que acompanhamos o automobilismo utilizando as contas oficiais dos pilotos nas redes sociais, gastamos pelo menos uns quinze minutos antes de sentar-nos à frente do computador e fazer o texto, áudio ou vídeo em nossas plataformas. Mesmo aqueles que tomam isso como um “hobby”, como eu, acabam se deparando com algumas surpresas ao longo da linha do tempo.

Eis que, antes de gravar o vídeo de ontem, aparece uma transmissão da conta oficial do jogo licenciado para videogames da Fórmula 1: um draft de pilotos virtuais realizado pelas equipes da categoria máxima escolhendo quem defenderia as cores das escuderias na competição que acontecerá no final do ano em Abu Dhabi.

Oi? Então a Liberty Media, no alto de sua capacidade de marketing, faz um evento nos moldes da NBA ou NFL para selecionar quem serão os jovens pilotos virtuais numa competição que chama a atenção de pequena parte dos fãs? Pois é, foi isso mesmo. Não que eu seja contra videogames de corridas: boa parte de minha infância e adolescência foi na frente da tela de computador jogando desde F1GP até atualmente F12017, o qual está devidamente empoeirado nas últimas semanas por motivos de preparação para recepção do Arturo.

É comum hoje no Brasil, e por aqui também, canais por assinatura ou abertos exibirem competições online entre equipes, em um mercado que só cresce e consegue reunir em eventos presenciais, facilmente, 5.000 pessoas. Torcem, suspiram e comemoram como se fosse um jogo entre seres humanos – quem diria que um dia faríamos essa distinção.

Concordo que, num esporte rico em possibilidades de marketing, até o jeito como o piloto coloca o óculos escuro cria uma nova oportunidade de venda de produto. Entretanto, não sei o quanto a Fórmula 1 “se vende” como categoria ao realizar essas competições. Houve o caso do Igor Fraga, piloto competente de F3 Brasil com o Dárcio dos Santos, que ano passado acabou se classificando para a grande final e perdeu para o inglês que não tem, digamos, todos os atributos físicos para dirigir em alto nível um carro real de corrida. Se compararmos com o Montoya ou algum piloto da F-Truck, talvez tenha. Impossível imaginar que Brendon Leigh contra o Igor, num kart indoor que seja, faça alguma frente ao piloto brasileiro. Entretanto, o inglês foi lá, calçou as meias – eles não aceleram de sapatos ou tênis – e conquistou o caneco. Viveu, de certo modo, seu dia de campeão mundial de Fórmula 1.

Verdade é que, para este ano, foram selecionados 40 (!) pilotos para participar das classificatórias. Com pontuação igual à da categoria real, os pretendentes disputam mini-campeonatos de três corridas e vão avançando até ao estágio final. Daqui até novembro, serão horas em frente à tela treinando e buscando o acerto do carro para tentar o título. Quando nem engenheiro eu era ainda, gastava algum tempo em frente ao computador buscando em blogs dos jogos quais os acertos que os outros usuários utilizavam para poder tirar aquele décimo que faltava para fazer a pole com a Minardi no GP3 para computador em Monza. Não duvidem, isto é possível nesse ambiente digital. Se contarmos a Toro Rosso como ex-Minardi, Sebastian Vettel em 2008 foi um Carlo Zanovello do mundo real.

Se dessa competição sair algum campeão mundial de categoria da FIA, levantem a mão para o céu e contemplem o milagre. Vale lembrar que, na febre do Gran Turismo no PlayStation 2, o primeiro piloto selecionado pelos desenvolvedores do jogo e treinado pela Academia de Pilotos da Nissan foi Jann Mardenborough. Atualmente com 26 anos de idade, o piloto britânico teve algumas passagens pela Carlin na GP3 e finada GP2 em 2014 e 2015. Neste ano, corre na GT 500 japonesa pelo forte time da Impul num míssil chamado Nissan GT-R, o qual este que vos escreve daria algo muito valioso em troca para dirigir por míseras três voltas, com 18 pontos no campeonato, na décima posição.

É pouco? Se você comparar com a carreira de Stroll, um dos piores no grid atualmente, parece ser; o piloto canadense já foi campeão da F3 Europeia. Tudo bem, dirão os mais incisivos, o canadense continua a ser o mesmo braço do início de 2017. De certo modo, tem mais jeito para os monopostos simplesmente por ter vivido a vida inteira dentro de um carro de corrida, desde o kart. Jann, por mais que se esforce, não consegue diminuir esta diferença de experiência em míseros cinco anos de carreira profissional. O inglês está longe de ser um Max Verstappen, muito longe. Entretanto, aproveitou a chance e vive de alguma forma do automobilismo, coisa que considerável parte da população mundial adoraria fazer.

O chamado “eSports”, seja qual lá for o jogo ou plataforma utilizado, veio para ficar. Não é difícil encontrar um jogador profissional de videogame, assim como também não é difícil encontrar quem vive de postagens de vídeos em YouTube. Apenas, não esperem que um piloto do nível de Hamilton, Vettel ou Alonso saia de uma competição dessas. A chance disso acontecer é perto de zero. Um piloto como esses que foram citados, acorda, come e dorme automobilismo. Passa o tempo da infância e adolescência, como o que eu mencionei no início do texto, ao invés de em frente à tela do computador, dentro de uma oficina ou um kart, aprendendo a passar as impressões do carro para o engenheiro ou mecânico.

Pessoalmente, não chama muito a minha atenção esse tipo de competição. Posso até perder alguns minutos em frente ao televisor ou computador acompanhando uma etapa ou outra. Para os mais puristas, as competições online não são mais do que um passatempo de jovens. É divertido, gera renda, enfim, tem os seus atributos. Mas, mesmo que não concordem, perto de pilotos dos carros reais, não passa de uma festa estranha com gente esquisita, como cantou uma vez o Renato Russo.

Por Carlo Zanovello (@NoVacuo)

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Jornalista. Abril, UOL, Yahoo, Estadão, Correio Paulistano.
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